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Morre o cantor Reginaldo Rossi

                            Foto: Cecília Sá Pereira/DP/D. A Press
Nenhuma metáfora de
bar, tristeza ou desilusão conseguirá traduzir, nesta sexta-feira, às 9h40, a
dor da partida do Rei do Brega, o cantor Reginaldo Rossi. O artista
pernambucano de 70 anos morreu depois de permanecer 23 dias internado no
Hospital Memorial São José, na Boa Vista, no Recife.
Ele havia sido
internado com dores no tórax e nas costas, mas descobriu a existência de um
tumor no pulmão, enfrentou sessões de quimioterapia, hemodiálise e precisou de
sedação e ajuda de aparelhos para tratar a doença.
A informação foi
confirmada pelo médico Murilo Guimarães, pneumologista do cantor e compositor.
Ele teve falência múltipla de órgãos.
Reginaldo Rossi entra
para a história da música como uma das vozes mais românticas do país. Em mais
de 50 anos de carreira, ele cantou os desencontros do sentimento humano,
especialmente ilusões, fetiches, dores e desamores comuns aos relacionamentos.
Contemporâneo de uma geração tachada de brega por cantar canções idolatradas
pelo povo, ao lado de Odair José, Amado Batista, Wando, Agnaldo Timóteo,
Fernando Mendes, entre outros, Rossi inverteu a lógica do rótulo e abriu espaço
para um gênero musical marginalizado no Brasil.
O cantor reformulou o
conceito de brega e, com músicas e declarações, esfregou na cara da sociedade a
incoerência entre a crítica e a vida real. Democratizou os sentimentos, uniu
pobres e ricos nas emoções e na mesa do bar, universalizou a dor, o amor, o
chifre e a alegria da roedeira ao pé de um garçom, definido por ele como o
confessor da humanidade, personagem inspiração para o maior sucesso musical.
“Quando o chifre dói, o diploma cai da parede”, “Não há quem não bregue depois
de três doses” e “No mundo inteiro, é romântico, mas, aqui, quem faz romantismo
é brega” foram frases de uma filosofia levada adiante em mais de 300
composições gravadas ao longo da carreira.
Dono de uma uma
cabeleira fora dos padrões de beleza, de uns óculos escuros onipresentes,
camisa sempre aberta no peito e uma voz inconfundível, Reginaldo fez sucesso
incontestável para além das fronteiras do estado. Começou com o rock e o
balanço da Jovem Guarda no grupo Silver Jets. Depois, em carreira solo,
enveredou pelas músicas românticas. Dominou o Norte e o Nordeste. Com a canção
Garçom, lançada em 1986, chegou ao restante do país e se consolidou como
artista nacional.
Reginaldo Rossi assumiu
a condição de popular das músicas às declarações. Orgulhava-se de preferir os
termos usuais para compor, em vez de se valer das palavras rebuscadas
agradáveis apenas à crítica. “Eu canto para o povão”, mandou avisar
por meio dos médicos, já do leito do hospital. As letras sempre remeteram à
simplicidade: a tristeza depois de ser deixado pela pessoa amada, os suspiros
nas carícias do casal, a traição, o bailinho, a ausência e a canalhice. Vieram
A raposa e as uvas, Mon amou meu bem ma femme, Tô doidão, Deixa de banca,
Garçon.
Com o microfone nas
mãos, desferiu golpes duros no machismo, ao exigir igualdade amorosa para as
mulheres, criticou a hipocrisia homofóbica, deu leveza ao chifre, calo social
brasileiro muitas vezes combustível para atos de violência. “Por que o homem
pode chifrar, chifrar, chifrar e a mulher não pode fazer nada?”. Rossi deu
transparência ao sentimento.
O cantor havia se
apresentado pela última vez em João Pessoa, depois de enfrentar três
apresentações seguidas no Manhattan Café-Theatro, em Boa Viagem, no Recife.
Estava com show marcado no revéillon, no Pina, Zona Sul do Recife, cidade cujo
hino informal é uma de suas composições mais adoradas: “Recife, a minha
cidade, o meu lugar”. Fumante inveterado de mais de dois maços de cigarro
ao dia, consumidor de uísque misturado com Coca-Cola e jogador contumaz de
pôquer, Reginaldo deixa a esposa Celeide e o filho Roberto. Mais: deixa órfão
uma legião de fãs acostumados a cantar, sorrir e chorar ao som de letras
capazes de desvendar e espalhar cada retalho da alma humana.
Allyne Ribeiro
Allyne Ribeirohttps://araripinaemfoco.com
Diretora de Edição e Redação de Jornalismo
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