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Caso Miguel: prefeito é alvo de pedido de impeachment por usar dinheiro público para pagar serviços domésticos de mãe e avó de criança

O prefeito de Tamandaré (Litoral Sul de Pernambuco), Sérgio Hacker (PSB), é alvo de um pedido de impeachment por quebra de decoro e uso de dinheiro público para o pagamento de três servidoras contratadas pelo município e que trabalhavam como domésticas na casa dele. Estão na lista a mãe e avó de Miguel Otávio, de 5 anos, que caiu do prédio de luxo, no Recife, onde o gestor mora. Hacker é marido de Sari Corte Real, indiciada pela por abandono de incapaz que resultou na morte da criança.

O pedido de cassação do mandato, protocolado nesta terça (7), é mais uma ação quer atinge o prefeito, desde que Miguel caiu de uma altura de 35 metros do Condomínio Píer Maurício de Nassau, uma das Torres Gêmeas, no bairro de São José, no dia 2 de junho.

No dia do acidente o menino estava sob os cuidados de Sari, primeira-dama de Tamandaré, enquanto a mãe dele, a doméstica Mirtes Renata, passeava com a cadela da família Hacker Corte Real.

Na segunda (6), o Ministério Público de Contas (MPCO) pediu a investigação de possíveis pagamentos irregulares de diárias para o prefeito. Segundo o órgão, ele teria recebido parcelas de R$ 400 para participar de reuniões no Recife, mesmo morando na capital.

O casal também é alvo de investigação por irregularidades no pedido de auxílio emergencial durante a pandemia. Na quinta-feira (2), o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) determinou o bloqueio parcial dos bens do prefeito e secretária de Educação, Maria da Conceição Cavalcanti.

Um dia antes, o Ministério Público entrou com uma ação para que o prefeito responda por improbidade administrativa, por causa da contratação de servidoras-fantasmas.

O pedido de impeachment de Sérgio Hacker foi protocolado por dois advogados. Liana Cirne, da Faculdade de Direito do Recife, e Higor Araújo entenderam que o prefeito de Tamandaré cometeu crimes de responsabilidade, que vieram à tona depois da morte de Miguel.

Miguel Otávio tinha 5 anos e morreu ao cair do edifício em que sua mãe trabalhava como empregada doméstica, no Recife — Foto: Reprodução/TV Globo

Um dos fundamentos é a assinatura de Sérgio Hacker dos atos de nomeação de Mirtes e Marta e de uma mulher chamada Luciene. “As três eram funcionárias privadas do prefeito e jamais prestaram serviços à administração municipal nem nunca usufruíram dos benefícios da função pública”, afirmou Higor Araújo, em vídeo postado nas redes sociais.

Segundo ele, “tais fatos foram confessados pelo prefeito, em ofício encaminhado ao Ministério Público de Pernambuco”. O advogado destacou que Hacker praticou “um ato de competência exclusiva do prefeito, de forma ilícita, o que caracteriza a infração jurídicopolítica”, afirmou.

Ao G1, Liana Cirne disse que as infrações praticadas por Sérgio Hacker “são de gravidade suficiente para serem sancionadas com a cassação do mandato, nos termos do artigo 4º do Decreto-Lei número 201/1967”.

Liana Cirne e Higor Araújo protocolaram pedido de impeachment, nesta terça (7), contra prefeito Sérgio Hacker — Foto: Liana Cirne/Acervo Pessoal

A advogada sintetizou o pedido e apontou detalhes da contratação da mãe e da avó de Miguel Otávio. Mirtes Renata, de acordo com ela, estava registrada como funcionária pública comissionada do município de Tamandaré, com admissão registrada no dia 1º de fevereiro de 2017.

Ainda segundo a autora do pedido de afastamento do prefeito, Marta Maria Santana da Silva também estava registrada como funcionária comissionada na prefeitura, entre fevereiro de 2017 e dezembro de 2019.

“As vítimas diretas da fraude jamais receberam qualquer valor oriundo do Município de Tamandaré que constasse em nome delas”, aponta o documento de pedido do impeachment.

Além disso, destaca o documento, Luciene Raimundo Neves, funcionária privada do prefeito, trabalha em sua residência, em Tamandaré.

“A nomeação de servidores públicos municipais comissionados, de confiança do gestor, é ato de responsabilidade do prefeito. Nesses três casos, ele tinha plena ciência de que tais nomeações deram-se em completo arrepio da legalidade, uma vez que o desvio de finalidade é notório: as servidoras, remuneradas pelo Erário, prestavam serviços particulares na residência do próprio Prefeito, beneficiário direto da ilicitude. Com isso, violou o preceito da legalidade”, afirma o documento.

O pedido de afastamento também aponta que “o prefeito do Município de Tamandaré retirou quase R$ 200 mil dos cofres públicos para pagar salários e benefícios de suas funcionárias particulares, desde 2017”.

Apesar de o pedido de afastamento ter sido protocolado, a Câmara Municipal de Tamandaré está em recesso parlamentar até 31 de julho. As atividades devem ser retomadas em agosto.

Quarentena

Outro problema levantado pela advogada é o procedimento de Sérgio Hacker durante a quarentena imposta pelo novo coronavírus. Segundo ela, o gestor contraiu a Covid-19 e “desrespeitou o isolamento social”.

“Ele agiu de forma incompatível com o decoro e dignidade do cargo de prefeito e mentiu, quando disse publicamente que estava respeitando as regras na pandemia”, afirmou Liana Cirne.

Além disso, afirmou a advogada, Hacker manteve Mirtes Renata trabalhando durante a pandemia, “em especial, porque o trabalho doméstico não foi considerado essencial em Pernambuco, salvo hipóteses excepcionais relativas a babás e cuidadoras de idosos, em casos em que tais serviços se mostravam indispensáveis, o que não era o caso”.

Outra questão levantada é o fato de o prefeito “infectar Mirtes, ao obrigá-la a trabalhar durante o período em que estava doente, violando normas sanitárias e disposições penais aplicáveis”.

Protocolo

A advogada informou que foi até a câmara Municipal de Tamandaré nesta terça e protocolou o pedido de impeachment. Ela disse que o presidente do Legislativo, Adriano Cândido (PSD), é obrigado a fazer a leitura pública, na primeira sessão que ocorrer depois da entrega formal do documento.

‘Ao contrário do procedimento de afastamento de presidente da República, no caso do município, o presidente da Câmara não pode engavetar o pedido. Ele terá que ler as 25 páginas para todos os vereadores”, disse.

Depois da leitura, caso os nove vereadores aprovem, o pedido de afastamento vai tramitar, de acordo com o regimento interno da Câmara. “Pode ficar perto da eleição, mas pode mexer com isso, já que Hacker deverá ser candidato à reeleição”, comentou Liana.

Resposta

Por meio de nota o prefeito Sérgio Hacker disse que, sobre o pedido de afastamento, “só tomou conhecimento da sua existência através da imprensa, não sendo, portanto, legítima e legalmente comunicado do seu conteúdo”.

Ainda de acordo com o gestor, o pedido, “se existir”, “demonstra claramente o interesse político que muitos vêm usando da situação em nítida antecipação do debate eleitoral”.

Hacker disse também que os responsáveis pelo pedido “estão mais preocupados com promoções pessoais” e isso “reforça, ainda mais, o caráter eleitoral da medida, acrescentando que ambos são militantes políticos de conhecido partido político local”.

Por fim, a nota destaca que o prefeito “não praticou crime de responsabilidade, cuja semelhante temática já foi objeto de julgamento pelo STF [Supremo Tribunal Federal] e STJ [Superior Tribunal de Justiça]”

Hacker declarou, por meio da nota, quer “confia plenamente na Câmara Municipal que, com serenidade e equilíbrio, saberá preservar a democracia e, notadamente, a vontade popular que o elegeu”. O G1 tentou contato com a Câmara de Tamandaré, por telefone, mas não conseguiu.

Diárias

Nesta terça, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) informou que aceitou o pedido de apuração do pagamento das diárias irregulares a Sérgio Hacker. Segundo a assessoria de comunicação do tribunal, a solicitação do Ministério Público de Contas foi acatada pelo relator, conselheiro Carlos Porto.

No caso Hacker, serão duas auditorias, segundo o TCE. Uma para apurar a contratação irregular da mãe de avó de Miguel pela prefeitura e a outra, por causa do pagamento de R$ 400 ao gestor para participar das reuniões no Recife.

O site “Tome Conta”, do TCE, informa que, em 2020, Sérgio Hacker recebeu, ao menos, duas diárias para reuniões na capital. Uma delas, em março, ocorreu no Palácio do Campo das Princesas, sede do governo estadual., distante 1,4 quilômetro das Torres Gêmeas, onde mora o prefeito.

Denúncia de fraude

Também nesta terça, a mãe de Miguel, Mirtes Renata, denunciou a criação de uma “vaquinha” falsa na internet, utilizando seu nome e a morte de seu filho. A empregada doméstica afirmou que não criou nenhuma campanha para arrecadar dinheiro e que possui casa própria.

Na página falsa da arrecadação, o criador da postagem se passa por Mirtes, afirmando ter 36 anos, ser diarista e precisar de dinheiro para construir uma casa própria. “É falso. Eu tenho 33 anos, era empregada doméstica ao invés de ser diarista e a minha casa é própria”, afirmou.

G1 de PE /Foto: Divulgação

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